Desde a graduação até o doutorado, de 2003 a 2014, no Departamento de Ciência da Computação (DCC) da UFMG, e sendo orientado desde sempre pelo professor Wagner Meira Júnior, Fernando Henrique de Jesus Mourão hoje reside na Austrália e é, atualmente, o principal responsible AI leader na SEEK. Olhando para a época de estudos no departamento, para o ex-aluno, pensar no DCC é pensar em oportunidades. “O DCC é sinônimo de oportunidades. Oportunidades para se especializar em variados temas; oportunidades de acesso a recursos materiais e humanos vitais para um desenvolvimento profissional pleno; oportunidades de se propor e avaliar ideias inovadoras; e oportunidades de se conectar a pessoas transformadoras. O DCC me forneceu ferramentas e suporte para solidificar um conhecimento técnico aprofundado. Meu orientador, o professor Wagner Meira, me deu liberdade para explorar meus próprios ‘devaneios’ científicos, trilhar meu próprio caminho, mesmo que torto. E, finalmente, o contato com um ambiente acadêmico diversificado e efervescente, me abriu novos caminhos e perspectivas. Essa combinação contribuiu para eu chegar onde estou”, garantiu.
Fernando hoje se dedica profissionalmente a capacitar profissionais e organizações em Inteligência Artificial (IA). “Hoje compreendo que sempre fui muito idealista e sempre tive uma visão mais ‘humanista’ da Computação, no sentido de tentar vislumbrar o impacto que geramos. Publicar por publicar nunca me apeteceu. Sempre almejei impactar as pessoas, fazer a diferença. Não por acaso, atualmente me dedico a capacitar profissionais e organizações a compreender, confiar, e controlar a IA, sempre vislumbrando seu impacto sobre a sociedade. Meu desejo é contribuir para consolidar uma relação mutualística entre humanos e Inteligência Artificial. De fato, percebo que algo verdadeiramente único que alcancei como aluno do DCC foi me conectar, interagir, impactar e auxiliar diversas pessoas. Enquanto aluno, fui coautor de 39 artigos científicos com outros 30 alunos (de graduação, mestrado e doutorado) e dez professores distintos do DCC, além de outras instituições de ensino do Brasil e dos Estados Unidos. Por anos seguidos, tive a oportunidade de coorientar dezenas de alunos e auxiliar outras centenas de alunos como estagiário em docência de AEDS III e Mineração de Dados. O departamento me ofereceu a oportunidade genuína de me desafiar constantemente de forma a atingir o meu máximo”, afirmou.
Segundo Mourão, a trajetória no DCC foi de grandes desafios e conquistas que o permitiram acreditar mais em si. “Me recordo que, sem conhecimento prévio do meu orientador, resolvi que queria fazer parte do meu doutorado com o professor Joseph Konstan, um dos criadores da área de Sistemas de Recomendação. Com a cara e a coragem, escrevi um e-mail bem modesto apresentando-me e expressando meu desejo em me juntar ao renomado grupo de pesquisa dele. Obviamente não informei meu orientador sobre o e-mail, pois sabia que as chances de respostas eram ínfimas. No entanto, após um dia, obtive uma resposta amigável do professor Konstan se prontificando em conversar comigo e com meu orientador para averiguar a viabilidade da colaboração. Obviamente gastei uns bons minutos processando o que estava acontecendo, incrédulo da possibilidade que ali nascia. Felizmente atingi meu propósito, fiz uma colaboração bem-sucedida sobre o meu tema de doutorado, com o auxílio dos professores Wagner Meira e Leonardo Rocha. Essa experiência me fez ver que mesmo coisas aparentemente inatingíveis são possíveis. Alguns podem chamar de sorte, mas prefiro acreditar que ‘sorte’ só aparece para os preparados”, desabafou orgulhoso.
Para Fernando, estudar no DCC representou, acima de tudo, oportunidade de ascensão social. “Mencionei que para mim o DCC representa oportunidades. Sob um prisma pessoal, o departamento representou sobretudo uma oportunidade de ascensão social. O vestibular de 2002 da UFMG foi minha primeira e única tentativa de ingressar em um ensino superior de qualidade e prestígio. Um negro, vindo de escola publica, filho de mãe solo, costureira e assalariada, muito provavelmente não teria outra oportunidade. Não passar nesse vestibular significaria postergar ou, muito provavelmente, abdicar de um sonho. Dessa forma, posso dizer categoricamente que se não tivesse passado pelo DCC não estaria onde estou nessa altura da minha vida”, contou agradecido.
Enquanto estudante no DCC, Fernando passou por algumas dificuldades, mas, também, por casos engraçados. “Formar em um curso de computação sem um computador pessoal traz desafios adicionais aos já propostos pelo curso. Me recordo de passar algumas noites em claro no laboratório implementando trabalhos práticos. A duras penas reconheci a necessidade de se balancear a vida profissional com a pessoal. Atualmente, o meu ideal de sucesso é um equilíbrio saudável e produtivo dessas duas forças. Um fato engraçado que ocorreu, ainda na graduação, me ajudou a maturar essa perspectiva. Desde o terceiro período da graduação trabalhei no laboratório e-SPEED. E, para conseguir alcançar meus objetivos na época, trabalhava em pesquisa por horas e horas todos os dias da semana. Quem me conhece sabe que não estou exagerando, era quase sempre o primeiro a chegar no laboratório e o último a sair. No campus Pampulha da UFMG, para se ter acesso aos prédios em horários noturnos, fins de semana e feriados, tínhamos que adicionar nosso nome em uma lista na portaria principal. O campus tinha dezenas de prédios de variados cursos e, por dia, passavam na ordem de dezenas de milhares de pessoas pela portaria principal. Além disso, os porteiros da UFMG trabalham em turnos, e raramente trabalham em fins de semana ou feriados consecutivos. Dessa forma, era praticamente impossível os porteiros reconhecerem um aluno aleatório que entrava a pé no campus e que nunca conversava com eles. Bem, …, assim eu achava. Um belo dia, chegando à UFMG em um desses horários especiais, ao pedir a lista de assinatura para a entrada, um porteiro virou para o outro e disse algo do tipo: “ah… esse aí não precisa assinar não. Eu o vejo sempre por aqui. Pode passar!”. Nessa hora percebi que estava indo mais que o recomendado ao laboratório. Hoje em dia, felizmente, não trabalho mais fins de semana, nem feriados, nem a noite”, relatou.
Conforme Fernando, o que mais o marcou no período em que esteve no DCC foram as pessoas. “Algumas pessoas foram particularmente marcantes na minha trajetória. Sempre tentei ser educado, atencioso e respeitoso com todos. Porém, posteriormente, passei a entender que para impactar as pessoas é necessário mais. Acredito que gentileza é uma virtude essencial neste sentido. Com o tempo, esquecemos o que as pessoas fizeram, falaram ou como se comportaram. Lembramos apenas o que pessoas e lugares nos ensinaram e, principalmente, como nos fizeram sentir. Algo muito vívido em minha memória para exemplificar essa perspectiva, foi uma conversa que tive com o professor José Lopes de Siqueira Neto. Ele estava ministrando a matéria de Inteligência Artificial e deu como trabalho uma competição para resolver o problema Qubic em Prolog. Não me recordo exatamente das palavras, mas lembro-me que quando fui validar minha ideia de solução, ele simplesmente me disse: ‘você tem talento para resolver problemas’. Essas palavras de extrema gentileza me fizeram sentir capaz. Se de fato tenho talento para resolver problemas, ou não, hoje me parece menos relevante que o efeito que esse sentimento desencadeou. Me moldei e tracei minha carreira a partir dessa crença, independente de ser uma verdade. Acredito que sou bom em resolver problemas de maneira inovadora, eficiente e eficaz, não por um eventual talento especial, mas sim pelo conhecimento acumulado e caminho trilhado. Incontáveis olhares, falas e ações como esta vieram do pessoal do café e suporte (Antonia e Alexandre), do pessoal da secretaria do DCC (Cláudia, Cida, Túlia, Sônia, Renata, Gilmara e Linda), de alguns professores (Meira, Raquel, Marcos Goncalves, Adriano César, Gisele, Siqueira, Virgilio) e de inúmeros colegas. A todos, minha eterna admiração”, descreveu grato.
Para os que estão, ou desejam entrar no departamento, Mourão ressalta que a jornada requer esforço, mas terá recompensa. “Seja tolerante, paciente e gentil consigo mesmo e com o próximo. A jornada no DCC traz muito esforço, dedicação, cobrança, estresse e algumas decepções. Torne essa jornada mais leve e você conseguirá aproveitar melhor as oportunidades que lhe serão apresentadas. Não é sobre ser o melhor, é sobre se tornar o seu melhor!”, concluiu.
Como professor do DCC há quase 30 anos, o José Siqueira teve a oportunidade, segundo ele, de encontrar e conhecer alunos brilhantes. “Esse é um raro prazer que todo professor tem. Fui professor de três alunos de uma mesma turma de Física que são meus colegas da UFMG hoje, na Matemática e na Física. Também tive a oportunidade de encontrar e conhecer o Fernando Mourão, bacharel em Ciência da Computação pela UFMG. Ele realmente tem o talento de resolver problemas, como ele disse: “…de maneira inovadora, eficiente, e eficaz…” Eu pude testemunhar isso como professor, vendo o programa jogador de Qubic arrasar todos os adversários, estudantes da mesma disciplina. O que eu fiz foi dizer-lhe o que eu estava testemunhando, como um bom mineiro faz procurando diamantes: vendo o brilho do Fernando aparecer com força nas ideias e capacidade de pô-las em prática. Fico muito feliz de ter tido o impacto que Fernando me imputa, mas o mérito é todo dele: ele acreditou em si, ele moldou-se, aprimorou-se. Eu, como testemunha, fico feliz por ele e por mim”, falou orgulhoso.
Segundo o professor Meira, a competência do Fernando pode ser facilmente verificada pela sua trajetória de sucesso até o momento, mas ele tem outra qualidade que realmente me impressiona: o conceito de máximo para ele não existe realmente. “Durante os dez anos que trabalhamos juntos, Fernando sempre foi muito além do que se esperaria para o seu nível de maturidade técnica à época, e sempre muito cordato e prestativo com todos com quem trabalhou. Um excelente profissional que converteu a sede de saber em muitos e significativos resultados. Muito honrado e agradecido de ter trabalhado com ele. Tenho certeza de que ainda está longe de chegar ao máximo”, afirmou.
Saiba mais sobre o Fernando: LinkedIn – https://www.linkedin.com/in/fernando-mour%C3%A3o-a40a5183 e Medium – https://medium.com/@fmourao