Concorrente do WhatsApp, Telegram tem como política não controlar inverdades difundidas nas redes e não colaborar com as autoridades para evitar ou punir os difusores
Equipe de cientistas do Departamento de Ciência da Computação da Universidade Federal de Minas Gerais (DCC/UFMG), coordenada pelo professor Fabrício Benevenuto, aponta que houve, no período de um ano, – janeiro de 2020 a janeiro de 2021 – crescimento de mais de 560% nas mensagens de fake news ligadas à política. De acordo com o mapeamento dos principais grupos e canais de discussão política em aplicativos, mais de 92% são de apoio ao presidente Jair Bolsonaro.
Segundo os especialistas, a migração para o aplicativo russo, apesar de ainda não ser o mais utilizado em solo brasileiro, causa preocupação por ser um meio de difusão imensa de desinformação e inverdades, com possibilidade de grupos de até 200 mil membros em contraponto com os pouco mais de 250 do WhatsApp. Além disso, o Telegram, que tem base em Dubai, nos Emirados Árabes, e estabelecimento legal no Reino Unido, não tem escritório no Brasil, não controla os conteúdos e não contribui com as autoridades de controle no combate às fake news.
Criado em 2018 pelos cientistas do DCC, o WhatsApp Monitor, segue as campanhas inverídicas nos grupos de mensagens de aplicativos. Também observou mensagens no Instagram e Tik Tok nas eleições de 2020 e, agora, monitora o Telegram. “O Telegram facilita a disseminação de mensagens para grupos enormes e os dados mostram que o aplicativo pode ser bastante explorado nas campanhas de desinformação na eleição de 2022, além de posteriormente circular a mesma desinformação pelo WhatsApp”, afirma Benevenuto.
Em 2021, o Telegram foi o aplicativo mais baixado do mundo e, de acordo com o estudo do DCC/UFMG, realizado por meio de palavras-chave relevantes e busca de links para o Telegram em outras plataformas, os canais políticos com maior número de inscritos, após o do presidente Jair Bolsonaro, são de blogueiros, influenciadores, parentes e políticos bolsonaristas e de extrema direita. “Houve um aumento exacerbado em mensagens com cunho político, tendo o cume em 2020 com a piora da pandemia do Coronavírus e confrontos entre o presidente Bolsonaro, o Superior Tribunal de Justiça e os governadores. Já em 2021, devido aos episódios com o então presidente Donald Trump, além das mudanças de política de privacidade no WhatsApp”, disse Fabrício.
Outro fator de preocupação é o uso de robôs e contas automatizadas pelo Telegram. De acordo com a pesquisa, há, inclusive, envio de inúmeras mensagens sem classificação oficial de robô pela plataforma e que compartilham outras plataformas de internet com conteúdos fakes. “Nossas análises mostram um volume expressivo de usuários brasileiros na plataforma associado a uma grande mobilização política encampada por grupos e canais de extrema direita, além de influenciadores e autoridades com perfis seguidos por centenas de milhares de pessoas”, diz o coordenador.
Outro fato relevante para os pesquisadores são os milhares de usuários do Telegram a mais do que os do WhatsApp, o que viabiliza o abuso de campanhas de desinformação nas eleições de 2022. “Se por um lado o WhatsApp implementou mecanismos para desestimular a viralização de informações inverídicas, no Telegram é possível repassar mensagens para grupos que têm até 200 mil pessoas, sem limite nos canais e sem controle pelas autoridades ou pelo aplicativo”, concluiu Benevenuto.