Alex Borges Vieira, ex-aluno do Departamento de Ciência da Computação da Universidade Federal de Minas Gerais (DCC/UFMG), tem acompanhado a série com os ex-alunos do DCC/UFMG e, segundo ele, como esperado, há várias pessoas de sucesso e tanta homenagem aos professores que, assim, resolveu focar nas saudades que sente. Desta forma, hoje iremos fazer um texto distinto, será um relato de um ex-aluno especial, divertido, engraçado, inteligente, competente e muito dedicado, como tantos outros que por aqui passaram, mas que resolveu contar a sua história de uma forma diferente. Alex fechou os olhos, respirou fundo, olhou para trás. Relembrou e sentiu outra vez no coração tudo aquilo que passou no DCC/UFMG e, hoje, sente MUITAS SAUDADES! Assim, te convido a acompanhar o relato desse ex-estudante, atualmente professor, para sentir também essa emoção!
Sinto saudades de chegar cedo ao ICEx, quase sempre com sol já queimando o rosto. Cada aula e cada sala, cada professor do Departamento… parecia ser uma vida inteira na memória. Mas passou…
Lembro dos meus amigos em sala de aula, nos Laboratórios. Sinto o cheiro do café da Antônia, quase sempre acompanhado por alguma abelha nas mesas. Nossos assaltos aos biscoitos secos do café do DCC eram tradicionais, assim como os encontros com os professores. Consigo imaginar ainda os corredores e até a bagunça de algumas salas. Quase todos eram bem bagunceiros e, assim, tenho desculpas hoje em dia. Digo aos meus alunos que peguei o costume de sala bagunçada com meus mestres e que isso é sinal de mente brilhante (pelo menos as deles eram). Sinto falta de chegar um pouco mais cedo à secretaria e abrir a porta, só para colocar escondido o trabalho no escaninho do professor. Claro, o trabalho era para ter sido entregue no dia anterior. Mas, se não foi visto sendo colocado em horário errado, quem pode dizer que não foi entregue no dia anterior (ps: isso foi dica de um professor!).
A cada intervalo de aula, a turma se reunia em alguns Laboratórios para ler e-mails nos terminais e ler rapidamente as notícias no abobrinhas e pérolas do DCC, a versão nem sempre politicamente correta do atual “acontece no DCC”, que hoje daria facilmente cadeia e notícias nos principais jornais. Nunca vou me esquecer do álbum de figurinhas do campeonato de futebol do Departamento, com pessoas ilustres da minha turma. E eu, de tão ruim no futebol, nem para patrocinador servi. Sim, estudei no DCC, fiz iniciação científica, trabalhei em projetos e até morei no Departamento. E, sem perceber, um dia foi o último. Mas, mesmo assim, vou fazer um relato… contar minha história.
Fiz curso técnico no Colégio Técnico Universitário (CTU) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e segui um amigo que fez vestibular na UFMG. Literalmente não tinha conhecimento nenhum sobre a UFMG e praticamente nunca tinha ido à capital. Resolvi arriscar e passei o ano estudando. A primeira vez, em idade adulta, que pisei na capital, foi no dia do vestibular. Lembro do ônibus chegando pela lagoa dos ingleses, descendo pela nossa Senhora do Carmo… e em um dos dias do vestibular, o América comemorava o acesso à série A.
No primeiro dia de aula, eu e Adriano Veloso (atual professor do departamento, amigo e colega de estudos desde os quatro anos de idade), estávamos perdidos e assistimos parte da aula de cálculo na sala errada. Isso porque ignoramos a informação dada por uma amiga nossa, a Keyla (no dia, uma total desconhecida). A cultura no DCC é algo único. Isso tenho que deixar bem claro. Passar noites fazendo trabalho, não desistir nunca, jamais. Concorrência sadia entre alunos por melhor desempenho. Isso moldou muito a minha vida e creio que dos meus amigos também. O que acho engraçado é que às vezes escutava no DCC que vez ou outra parava um disco voador por lá… e deixava um aluno estranho. Um aluno extraordinário. Acho que na minha turma parou um ônibus espacial inteiro. Era muita gente diferenciada. Em todos os sentidos. Basta ver a quantidade de professores atuais do Departamento que foram da minha turma (Adriano Alonso Veloso, Fernando Magno Quintão Pereira, Luiz Filipe Menezes Vieira, Marcos Augusto Menezes Vieira).
Decidi não sair do DCC ainda na graduação. Fazia estágios como administrador de sistema
em Laboratórios da UFMG e sempre tentava bolsa de iniciação científica. Não era tão comum ou fácil na época. Consegui minha primeira bolsa de iniciação científica com os professores Sérgio Vale Aguiar Campos e Berthier Ribeiro-Neto, no Laboratório de Vídeo Sob Demanda (VoD). Trabalhávamos em conjunto com os professores Edmundo de Souza e Silva Rosa Maria Meri Leão, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Basicamente, a tecnologia desenvolvida no Laboratório é o substrato de aplicações como Netflix, Youtube e Spotify. Claro, eu não fiquei rico com minha iniciação científica… mas aprendi muito.
Estudávamos e trabalhávamos muito, mas nos divertimos também. Eu e meus amigos do VoD, a Daniela Alvim, Marisa, Lamarque e Mateus, resolvemos fazer uma confraternização de fim de ano e chamar os orientadores. Mas ninguém queria tirá-los no amigo oculto. Nesse momento, nós criamos o “inimigo-oculto”. Nós fizemos um sorteio falso, onde o professor Sérgio foi induzido a acreditar que, por sorte, tirou o nome do professor Berthier e vice-versa. Ainda bem que não tinha auditoria nos nomes escritos nos vários bilhetinhos do sorteio levados a eles. Lembro que o professor Berthier estava começando a empreender bastante na época, e o professor Sérgio, incorporando a brincadeira de inimigo-oculto, deu a ele uma gravata digna do cantor Falcão. Fico imaginando o Berthier em uma reunião da Google com essa gravata (risos).
O professor Sérgio se tornou meu orientador de mestrado e, depois, no doutorado. Mais que isso, se tornou um grande amigo e inspiração para mim. Logo que comecei o mestrado, o professor Sérgio estava envolvido em projetos muito importantes, como o “computador popular”. Isso inspirava muito novos trabalhos e formas para possibilitar o uso de computador e Internet por todos. Continuei o mestrado na mesma linha de vídeo na internet, mas sincronizando o conteúdo armazenado com eventos que poderiam acontecer no computador. A ideia era utilizar vídeo e eventos para melhorar a imersão de alunos e professores em ensino a distância. No final do mestrado, conheci a professora Jussara Marques de Almeida e, a partir daí, minha vida acadêmica teve grande impulso. A professora Jussara chegou muito cheia de ideias e o Laboratório ficou muito movimentado nessa época. Chegaram novos alunos de graduação, como o Cristiano e o Ítalo Fernando Scotá Cunha, também atual professor do DCC.
Ao fim do meu mestrado e início do doutorado, literalmente fui adotado pela família dos meus amigos Luiz Filipe e Marcos Augusto (Flip e Flop). Fiquei sem local para morar repentinamente e não consegui república durante um fim de semana. Juntei as cadeiras do laboratório e dormi lá por uns dias. Tentava ajeitar uma república ou pensão, mas estava tudo difícil. Eles perceberam aquilo e chegaram do jeitinho deles (que eu imito bem) e falaram “Ligamos pra minha mãe. Hoje você dorme lá em casa”. O que era pra ser uma ajudinha de dois ou três dias se tornou uma adoção de anos, principalmente porque o Flop saiu antes para o doutorado que o Flip. Durante o doutorado, me tornei uma pessoa muito diferente. Minha família se juntou a mim e até minha filhinha me acompanhou ao Laboratório muitas vezes. Aprendi a fazer pesquisa com vários professores, além do meu orientador. Observava cada professor e tentava os imitar, até conseguir caminhar com o mesmo estilo. A cultura de competição da graduação se transformava em cultura de cooperação no doutorado. Aprendi a fazer parcerias duradouras. Meus primeiros artigos, com meus amigos de disciplinas, como o Nacif, se tornaram ideias sólidas para meu projeto de doutorado e, logo depois, se transformaram em temas para meus primeiros orientandos. Nós nos transformamos e criamos nossos primeiros projetos de pesquisa submetidos a órgãos de fomento e, posso dizer, que graças ao que passei no doutorado no DCC conquistei meus projetos de pesquisa mais importantes até hoje.
Depois de formado, fui professor da PUC Minas, na região metropolitana. Tenho grande paixão e admiração pela PUC-MG, seja pela organização da instituição, pela qualidade de ensino oferecida e também pela estrutura que nos era dada. Entretanto, me senti compelido a retornar para o interior e, hoje, estou na UFJF. Mantenho laços de pesquisa com grande número de professores do DCC (em ordem alfabética para não gerar ciúmes): Daniel Macedo, Ítalo Cunha, Jussara Almeida, Luiz Filipe, Marcos Augusto e Michele Nogueira. Com esses professores, desenvolvo pesquisa em diversas áreas importantes para o país, como redes de computadores, redes sensores, IoT, e ciência de redes.
O Alex foi um aluno que ficou com o professor Sérgio por muito tempo, da graduação ao doutorado. Segundo o docente, Alex foi sempre um excelente aluno, com boas notas, boas ideias e bom desempenho. “Era sempre uma dúvida sobre o que ia prevalecer, a competência ou o espírito impulsivo. Mas a competência prevaleceu, mesmo quando ele quis colocar nos computadores do Laboratório nomes de atrizes famosas. Em diversas áreas de atuação… 🙂 Felizmente era somente uma brincadeira… E houve naturalmente o “inimigo oculto” no Laboratório, uma pegadinha muito boa. Todos participamos, professores e alunos. Mas os alunos não queriam pegar os professores como “inimigos oculto”, o que dar de presente? Então tiveram uma ideia “excelente”, capitaneada pelo Alex. Éramos dois
professores, eu e Berthier. Quando fui escolher o nome me apresentaram diversos papéis dobrados. Todos com o nome do Berthier. E à ele o mesmo, mas com todos os papéis com o meu nome. Assim o “inimigo oculto’ correu bem, sem alunos presenteando professores (risos)”, relatou.
“Bem, quando Alex foi fazer o doutorado a pegadinha foi minha. Normalmente um aluno quando começa o doutorado segue a linha de pesquisa do orientador, que sugere um tema de estudo. Quando eu fiz o doutorado nos Estados Unidos não era assim, cada aluno tinha que sugerir com seu tema de doutorado. Mas isto faz com que o tempo de titulação aumente, pois o aluno gasta tempo para entender o que pode ser feito. Com o Alex, contudo, resolvi testar este método. Simplesmente não sugeri a ele nenhum tema, esperei para ver o que surgiria. E surgiu um trabalho excelente. Escolha de tema dele, desenvolvimento independente, tese bem defendida. E é assim que se forma um bom doutor, a independência na pesquisa tem que começar cedo. No Brasil isto é mais difícil porque somos cobrados muito pelo tempo de titulação, mas em casos especiais, como o do
Alex, funciona muito bem”, concluiu orgulhoso.
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