Pesquisa feita no DCC/UFMG sobre os biocombustíveis de segunda geração pode trazer economia e ganhos para o meio ambiente

A dependência por produtos derivados do petróleo, principalmente no que diz respeito aos combustíveis, coloca em risco o meio ambiente e, por consequência, a vida humana. Com o objetivo de minimizar tal dependência e, assim, utilizar produtos menos nocivos, o aluno do pós-doutorado do Departamento de Ciência da Computação (DCC) da UFMG, Diego Mariano, vem pesquisando as mutações benéficas para enzimas usadas na produção de biocombustíveis. Os biocombustíveis de segunda geração têm potencial de dobrar a produção brasileira sem a necessidade de aumentar as áreas de cultivo, o que representaria economia ao ser reduzido o custo da produção tanto do etanol quanto da gasolina vendidos em postos de combustíveis brasileiros, já que a gasolina vendida no Brasil contém cerca de 27% de bioetanol.

De acordo com Diego, a pesquisa é bastante ampla e ainda pode demorar um tempo para ter impactos concretos no consumidor final, mas alguns resultados já estão sendo vistos e, portanto, segundo ele, vislumbra-se que tanto o meio ambiente quanto os usuários percebam os benefícios. “As mutações que estamos pesquisando são aplicadas em laboratório por meio de técnicas de engenharia genética, mas há um custo elevado para cada teste, afinal, testar uma única mutação pode levar meses. Como são muitas possibilidades, é importante definir antes qual a ordem de testes que deverá ser feita. Por isso, usamos técnicas computacionais para verificar isso antes. Por meio do modelo que desenvolvemos, testamos milhares de possibilidades e indicamos para o pessoal que faz os testes em laboratório quais as melhores opções para serem testadas. Nosso objetivo é diminuir o tempo que gastam e, assim, agilizar os resultados”, explicou.

Conforme Mariano, os resultados estão sendo avaliados criteriosamente, assim como estão sendo feitos diversos experimentos e com vários pesquisadores envolvidos. “A parte computacional está quase finalizada, apesar de que sempre surgem novas ideias para testarmos. Além disso, ainda tem a parte experimental feita em laboratórios de biologia molecular, que é vital da pesquisa e é feita pelos grupos de pesquisa que colaboram conosco, como a BaBEL, uma rede multidisciplinar de pesquisa científica e tecnológica, o professor Luis Fernando Marins, da Universidade Federal do Rio Grande (FURG), que nos trouxe esse problema de pesquisa e atua nas etapas experimentais do projeto, além de pesquisadores da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), da Universidade Federal de Alfenas (Unifal), da Universidade Federal de Viçosa (UFV), da Universidade Federal de São João Del-Rei (UFSJ), da Universidade Federal de Itajubá (UNIFEI) e da Universidade de São Paulo (USP)”. Minha pesquisa é apenas uma pequena parte de um imenso projeto. Não se faz pesquisa sem boas colaborações e o nosso grupo tem obtido muitos resultados que deram origem a publicações e a pedidos de patente”, contou.

Segundo Diego, mesmo sabendo que os custos irão diminuir, não há como garantir se irão chegar ao consumidor final. “É claro que resultados práticos só virão depois de alguns anos. Ainda não podemos mensurar a real redução de custos na produção dos biocombustíveis, pois a definição desses custos depende de muitos fatores. A redução de custos de produção é sempre benéfica, mas infelizmente não dá para garantir que, se as propostas forem aplicadas e gerarem uma real economia, esse desconto será repassado para o consumidor final. Depende da indústria, do governo e do mercado”, disse.

Segundo o pós-doutorando, os experimentos têm obtido bons resultados quando comparados com dados experimentais realizados no passado, além de excelentes resultados acadêmicos. “Além do campo prático, na área acadêmica conseguimos propor hipóteses que explicam os mecanismos de funcionamento de enzimas resistentes a inibição, e que nos gerou boas publicações (COSTA et al., 2019). Nossos modelos chegaram a propor muitas mutações que poderiam ser benéficas e que estão sendo avaliadas em laboratório. Temos alguns resultados experimentais promissores, mas eles ainda estão em processo de pedido de patente”, esclareceu.

Colocar esse projeto em uso depende não apenas dos resultados obtidos pelos pesquisadores, mas de diversos outros fatores. “Não adianta encontrarmos enzimas mais eficientes para produção de biocombustíveis, é preciso que o governo ou iniciativa privada decidam investir nesse tipo de indústria. Note que o Brasil investia bastante em biocombustíveis, desde a década de 1970. De fato, os biocombustíveis ainda têm um fator estratégico importante para nossa matriz energética, mas os investimentos na área têm reduzido. Há alguns anos havia uma grande esperança para o setor de biocombustíveis de segunda geração, entretanto, os investimentos em usinas de produção de biocombustíveis têm reduzido drasticamente nos últimos anos. Além disso, a pandemia de COVID-19 levou ao fechamento de muitas usinas de produção no Brasil e no mundo, o que agravou a situação. Infelizmente, a curto prazo não temos boas notícias, mas talvez as coisas mudem no futuro. Vamos continuar firmes em nossas pesquisas, aguardar e esperar que o melhor ocorra”, falou.

Tecnicamente o estudo pode ser aplicado não apenas para produção de biocombustíveis. De acordo com o cientista, a técnica pesquisada pode ser aplicada para avaliar quaisquer tipos de produtos biotecnológicos. “A estratégia apresentada pode ser usada para enzimas em geral, desde que se tenha as estruturas tridimensionais (podem ser modeladas computacionalmente com base em suas sequências), que se tenha exemplos de enzimas consideradas boas para as tarefas que devem realizar e se modele bem o problema biológico que deseja resolver. Com essas informações, podemos aplicar o algoritmo de obtenção de assinaturas estruturais e compará-las usando modelos matemáticos simplificados”, afirmou Diego.

Esta pesquisa já foi publicada em várias revistas científicas e, também, escrita para jovens, usando um formato de divulgação científica, no periódico Frontiers for Young Minds, que publica conteúdo sobre ciência em geral para pessoas entre 8 e 15 anos. De acordo com a professora do DCC/UFMG, Raquel Minardi, esta é uma iniciativa muito importante para difusão da área e atração de talentos para a Computação e para a Bioinformática. “Muitas vezes, os estudantes nessa faixa etária começam a escolher sua profissão, tem aptidão em duas ou mais áreas, mas não vislumbram a possibilidade de uma atuação profissional interdisciplinar. Acreditamos que a divulgação deste trabalho pode ter esse papel de levar aos estudantes novas possibilidades de atuação profissional ao cruzar áreas do conhecimento”, afirmou.

A imagem utilizada na matéria é de autoria do periódico citado acima

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