Com a proximidade das eleições de 2018 e com as recentes regras aprovadas pela reforma política para propaganda eleitoral na internet, as preocupações com notícias falsas na internet e nas mídias sociais voltam à tona. Não se trata de um problema tecnológico apenas. Trata-se sim de um problema com sérios custos políticos e sociais.
A mediação entre as pessoas e a informação é feita cada vez mais pelas plataformas globais, como Google, Facebook, YouTube e Twitter ou por aplicativos de mensagens como Whatsapp. As plataformas de redes sociais têm uma estrutura dramaticamente diferente das mídias tradicionais. As notícias podem ser transmitidas entre usuários sem filtragem significativa de terceiros, sem verificação factual e sem julgamento editorial.
Um usuário individual, sem histórico ou reputação, pode em alguns casos alcançar tantos leitores quanto jornais tradicionais. Um vídeo amador nas mídias sociais pode vir a ter audiência comparável a alguns programas de televisão. No ambiente digital da Internet e das redes sociais cresce a circulação de notícias falsas, histórias falsas, imagens falsas, vídeos falsos e comentários feitos por usuários falsos ou robôs.
Embora notícias falsas e desinformação tenham sempre existido, o que diferencia tudo agora é a tecnologia das redes e mídias sociais. Tecnologia que permite publicar e distribuir conteúdo com baixíssimo custo. Tecnologia que favorece a disseminação de fragmentos de notícias nas mídias sociais, que aparecem nas telas dos celulares e nos “feeds de noticias do Facebook ou Twitter. Tecnologia que permite também a proliferação de robôs e usuários falsos que disseminam comentários agressivos, extremistas ou falsos pelas várias redes sociais. Isso torna o problema das chamadas notícias falsas uma ameaça para os processos eleitorais transparentes e democráticos.
Em um artigo acadêmico publicado recentemente nos Estados Unidos, dois professores americanos das Universidades de Nova York e Stanford analisam em profundidade o impacto das mídias sociais e notícias falsas na eleição americana de 2016. As notícias falsas são conteúdo (i.e., texto, imagem ou vídeo) criado para enganar ou influenciar o leitor. Pode ser uma notícia totalmente fictícia ou uma distorção de fatos reais. O artigo se concentra nas notícias falsas que tiveram implicações políticas, ou seja, notícias intencionalmente fabricadas com o intuito de induzir o eleitor a favorecer um candidato ou partido. “O Papa apoia o Trump”, “Hillary vendeu armas para o ISIS”, “Agente do FBI, suspeito de vazar os e-mails de Hillary, foi encontrado morto” foram manchetes falsas que se tornaram virais nas redes sociais no início da campanha eleitoral, ganhando enorme visibilidade nas redes sociais. A história falsa do apoio do Papa a Trump foi compartilhada mais de um milhão de vezes no Facebook e um grande número de pessoas pesquisadas relatou acreditar na manchete.
Uma questão interessante é saber quem produz as notícias falsas e quais são suas motivações. As notícias falsas têm sua origem em vários tipos de sites. Alguns sites são criados com a finalidade explícita de produzir artigos intencionalmente fabricados e enganadores. Esses sites tendem a ter vida curta, pois perdem logo a credibilidade. Muitos sites que criaram notícias falsas na campanha americana já não existem mais.
Duas são as principais razões para criação de sites de notícias falsas. A primeira motivação é financeira. Artigos falsos que se tornam virais nas mídias sociais podem gerar receita significativa oriunda de publicidade. Vários sites de notícias falsas criados por jovens em países do Leste Europeu produziram histórias favorecendo Trump ou Clinton, gerando dezenas de milhares de dólares de faturamento. A segunda motivação é ideológica. Alguns provedores de notícias falsas procuram favorecer candidatos de uma linha ideológica ou denegrir os oponentes.
As notícias falsas não são criadas pelas redes sociais, mas podem ganhar circulação e visibilidade através da dinâmica e dos algoritmos das redes sociais. Uma maneira de avaliar a importância das mídias sociais para produtores de notícias falsas é analisar como as pessoas chegam aos sites de notícias falsas. Cada vez que um usuário visita um site de notícias falsas, esse usuário digitou diretamente o nome do site ou foi encaminhado a partir de algum outro site. As principais fontes de referência incluem as mídias sociais, como Facebook ou Twitter e as máquinas de busca como Google e outros.
No estudo dos professores americanos, os eleitores chegaram aos sites de notícias falsas através das seguintes formas: 30,5% pelo próprio nome do site, 22% por meio das máquinas de busca como Google, Bing e Yahoo e 41,8% pela mídia social, como Facebook, Instagram e Twitter. Na análise de 41 notícias falsas pró-Clinton e 115 pró-Trump, viu-se que essas notícias foram compartilhadas no Facebook 7,6 milhões e 30,3 milhões de vezes, respectivamente. Apesar da crescente presença das mídias sociais, o artigo mostra também que a TV foi a fonte mais importante de notícias e informações sobre as eleições americanas de 2016.
Na preparação das eleições de 2018, o Brasil tem a chance de aprender com a experiência dos Estados Unidos, Alemanha, Reino Unido, França e Holanda, que passaram por eleições recentes, onde as plataformas digitais tiveram papel acentuado na disputa política e onde houve também a disseminação de notícias falsas na internet. Alguns desses países têm adotado medidas visando coibir as notícias falsas e aumentar a transparência do processo de propaganda eleitoral nas mídias sociais e na internet.