“Quando vislumbrei ser cientista como profissão me encontrei imediatamente”, afirma professora do DCC/UFMG

Apaixonada pela matemática e pelo desenho desde criança, a professora do Departamento de Ciência da Computação (DCC) da UFMG, Raquel Cardoso de Melo Minardi, escolheu a área da computação já aos 14 anos, quando decidiu fazer o curso técnico em Informática Industrial no CEFET-MG. Antes de definir por este curso, pensava em fazer o curso técnico em Edificações, mas, por influência e incentivo da mãe, optou pela Informática Industrial. “Eu era muito nova e a escolha foi incentivada pela minha mãe. Eu gostava muito de matemática e de desenhar e pensava em fazer o técnico em Edificações. Minha mãe achou que Informática era mais atual e tinha mais futuro. Como sempre fui muito dedicada e gostava de estudos em geral, ela acreditava que teria sucesso em qualquer área que escolhesse”, contou.

Enquanto estudante, Raquel conta que passou por alguns desafios, mas, também, teve muito incentivo e inspiração para seguir em frente e vencê-los. “O maior desafio era o volume de conteúdo a estudar e os inúmeros trabalhos práticos ao mesmo tempo. Por ter me formado no curso técnico em Informática, já iniciei a graduação estagiando na área. Era pesado conciliar tudo. Eu praticamente não tinha vida social durante a graduação, já que me exigia muito em termos de desempenho acadêmico. Não aceitava não tirar A em uma disciplina. Ao mesmo tempo, o maior incentivo sempre foi da minha família, todos sempre acreditaram muito em mim, me apoiaram de todas as formas possíveis, seja financeiramente, com conselhos e companhia. Meus pais sempre me incentivaram a batalhar nesse momento de graduação, aprender o máximo, ser a melhor profissional. As maiores inspirações sempre foram meus professores. Desde os primeiros períodos, percebi que estava tendo contato com os melhores pesquisadores das diversas áreas da computação no país. Valorizei muito a oportunidade de aprender com os cientistas mais renomados do país em cada uma das disciplinas. No início do curso, já tive o desejo de conhecer mais da carreira acadêmica”, afirmou.

Raquel foi aluna do DCC/UFMG, onde fez o Bacharelado em Ciência da Computação e fez o doutorado direto em Bioinformática. “Uma das minhas principais lembranças do período da graduação é o volume de esforço e dedicação que foram necessários. Sempre soube que era uma fase e mergulhei de cabeça para tirar o máximo que o curso me oferecesse. Queria estar na universidade o tempo todo, viver o ambiente do Campus, assistir a seminários de vários cursos, estar na biblioteca, conhecer as várias áreas da Computação, viver intensamente mesmo esses anos de graduação. E a lembrança que sempre fica é de que foi muita dedicação, mas que houve muitas recompensas posteriormente”, garantiu. Ainda estudante, Minardi sempre foi muito motivada por estudos mais avançados, e gostava das conexões entre as disciplinas, e buscava ir atrás do que não sabia e queria entender. “Quando conheci o ambiente científico, quando vislumbrei ser cientista como profissão, me encontrei imediatamente. Como no Brasil a ciência se faz majoritariamente na universidade pública, ser professora se tornou um caminho natural. Mas, de toda forma, sempre gostei de ensinar. Antes de toda prova, muitas vezes havia um grupinho de colegas ao meu redor para que eu explicasse algum conteúdo de última hora ou para passar um resumo na matéria”, disse.

Colega da Raquel na maioria das disciplinas que cursaram durante a graduação no DCC/UFMG, além de compartilhar o laboratório durante muitos anos e, agora, professores no mesmo departamento, o professor George Luiz Medeiros Teodoro  contou que a Minardi foi um destaque durante todo esse período. “Sempre atenta e responsável, era uma das colegas com melhor desempenho, além de sempre ter sido muito cooperativa com os colegas e professores. Após a graduação, ela seguiu no doutorado em Bioinformática, continuando na mesma direção que vinha pesquisando durante a graduação. Particularmente sou um admirador de trabalhos multidisciplinares e achei essa tomada de decisão muito acertada e corajosa. Atualmente, a Raquel é uma das figuras de maior destaque em pesquisa e ensino em sua área, e continua sendo a mesma pessoa dedicada, cuidadosa e simpática de sempre. Tenho orgulho de ter compartilhado esse tempo com ela no departamento, admiro sua competência e torço para que continue sua caminhada de crescimento contínuo. Tê-la como professora e colega no DCC é motivo de muita honra”, falou.

Quando fazia Iniciação Científica (IC), Raquel teve uma espécie de colaboração com Carlos Henrique da Silveira, que fazia o doutorado em Bioinformática na UFMG. “Eu era uma espécie de coorientador da IC dela, embora os orientadores formais fossem o professor Wagner Meira, do DCC/UFMG, e o saudoso professor Marcelo Santoro, do ICB/UFMG. Na Bioinformática é assim, uma grande mistura de áreas e de pessoas incríveis. Creio que o professor Meira não me deixaria esquecer de um episódio que aconteceu num dos meus seminários de bioquímica para computação, que ministrava no DCC/UFMG. Na ocasião, eu fazia uma rápida revisão histórica do início do Universo e da vida em nosso planeta, relembrando teorias de como surgiram os átomos e da abiogênese. Então, mostrava como poderiam ter sido forjados pelas estrelas os átomos essenciais à vida (carbono, oxigênio, nitrogênio e outros), a síntese dos primeiros pré-bióticos numa Terra primitiva, primeiros biopolímeros, protocélulas, numa sequência evolutiva, até que chegou numa imagem de microscopia 3D de varredura de vários espermatozóides. Num ímpeto, virei para a Raquel e perguntei: – Raquel, parte de você já foi um espermatozóide, o que você acha disso? Ela riu sem saber o que responder ou respondeu algo que não me lembro mais. A pergunta tinha uma intenção séria e filosófica, mas despertou uma fenomenal crise de risos no professor Meira e acabou entrando para o folclore da Bioinformática na UFMG. Tenho orgulho de ter participado da formação da talentosa professora Raquel Minardi, e de ter contribuído pela paixão que ela tem pela Ciência. Nos agradecimentos da minha tese de doutorado, deixei registrado algo que sempre disse a todos: que a Raquel foi, de longe, um dos maiores resultados do meu doutorado”, contou Silveira. 

Atualmente, Minardi ensina Programação, Bioinformática e Visualização de Dados. Segundo a docente, cada disciplina tem objetivos e públicos diferentes e, desta forma, tenta se adequar e diferenciar conforme esses objetivos. “Uso muito conteúdo adicional on-line, aulas gravadas como material suplementar, exercícios de revisão, textos complementares. Penso que a troca com os alunos em sala de aula é essencial. É esse convívio que molda cada aula e caminha conforme as curiosidades e dificuldades que vou percebendo nas turmas. É muito bom quando consigo receber algo da turma, quando eles participam, dão retorno, interagem. Sinto que consigo oferecer o melhor assim. Sou muito dedicada, prezo por estar sempre atualizada. Estou constantemente melhorando meu material, buscando feedback dos estudantes, estudando não só sobre a minha área de pesquisa, mas sobre metodologias de ensino em geral. Espero conseguir estar sempre em evolução e não ficar parada no tempo. Me considero também uma professora bastante flexível. Estou sempre aberta às sugestões dos alunos sobre como executar cada disciplina de acordo com as demandas e curiosidades deles. O que mais me inspira enquanto professora é a responsabilidade que temos sobre o futuro do país e o futuro de cada aluno. Porque como já dizia Paulo Freire, “a educação muda as pessoas e as pessoas mudam o mundo”. Muitos dos meus professores me mudaram, me inspiraram a gostar de literatura, de arte, de matemática, muito pelo o encantamento que tinham com esses assuntos. Lembro-me com carinho de cada inspiração de cada professor. Por isso, essa possibilidade de contribuir para o futuro dos alunos me inspira. Receber mensagens de ex-alunos contando onde trabalham, com o que trabalham, e como alguma disciplina que ministrei foi importante para eles, renova as energias e a inspiração”, falou.

Com um vasto currículo, Minardi se orgulha principalmente de dois tópicos. “Há dois tópicos dos quais me orgulho bastante. “O primeiro foi ser eleita membro afiliado da Academia Brasileira de Ciências (ABC) e ter sido, por dois mandatos, representante titular eleita pelos colegas membros afiliados da ABC para o conselho da ABC. Tem sido uma oportunidade de grande aprendizado, pois me permitiu interagir com colegas de diversas áreas e de todo o país para discutir desafios, soluções e projetos em prol da ciência nacional e da carreira científica. O segundo é a criação de um projeto de extensão universitária que envolve a divulgação científica e também cursos a distância. Atualmente, esse projeto foi selecionado para receber um financiamento da Fapemig em um edital específico de comunicação científica. Esses projetos alcançam milhares de estudantes e têm atraído inúmeros alunos para os PPGs em Ciência da Computação e em Bioinformática. É com muita empolgação que faço esse trabalho de divulgação da ciência e da minha área de pesquisa”, contou. 

Casada e mãe de dois filhos, o Victor de 8 anos e o Lucas de 4 anos, Minardi, nas horas vagas, gosta de estar com a família e se divertir com eles. “Seja viajando, no clube, praticando esportes ou em casa, assistindo um filminho, amo ficar com a minha família”, revelou.

No bate-papo com a comunicação do DCC/UFMG, a professora também falou sobre pesquisa e os objetivos que têm com elas, sobre o Departamento e, também, sobre os alunos. Veja abaixo as respostas na íntegra:

Por que decidiu ir para a área de pesquisa e não para o mercado de trabalho?

Eu tive experiência de mercado até o meu 5º período, fazendo estágios, e achava o trabalho um tanto repetitivo. Gostava de cada estágio até aprender a fazer o que era necessário em cada um. Após esse período de adaptação, em que sentia que estava aprendendo e crescendo, estava ótimo, o restante se tornava um pouco enfadonho. 

No quinto período, fui fazer Iniciação Científica e soube que havia encontrado meu lugar. Gosto muito da possibilidade de estudar e criar projetos que estão de acordo com meus interesses e curiosidades, mas que tenham impacto para a sociedade. É muito bom poder atuar sempre na fronteira do conhecimento, estudando descobertas recentes, fazendo perguntas não antes respondidas, criando e testando hipóteses. 

O que a inspira em suas pesquisas?

O que mais me inspira é a possibilidade de contribuir com diversas áreas do conhecimento e com a solução de problemas sob a perspectiva computacional. Acho muito importante podermos levar as técnicas que desenvolvemos a serem usadas na prática em diversas disciplinas, seja na academia, seja na indústria. E indo além, essas áreas sempre nos desafiam de volta com novos problemas que demandam soluções inovadoras.

Qual o maior objetivo das suas pesquisas?

Desenvolvo métodos computacionais (algoritmos, modelos, programas) que resolvem os mais diversos problemas nas ciências da vida. Por exemplo, através dos métodos que desenvolvemos podemos apoiar no desenvolvimento de vacinas ou de outros compostos como pesticidas, enzimas para uso industrial, dentre outros.

No geral, qual o impacto das suas pesquisas no dia a dia das pessoas?

O impacto da minha pesquisa está principalmente em potencializar o uso, gerando novas descobertas através de dados gerados nas ciências da vida. Por exemplo, como usar o enorme volume de dados de genomas, proteínas, pequenas moléculas, dentre outros no desenvolvimento de produtos biotecnológicos? 

Qual o maior desafio (ou quais os maiores desafios) que encontra para realizar as pesquisas?

Atualmente, o maior desafio é a escassez de investimento em ciência e tecnologia no Brasil, além da luta contra a desinformação que vem sendo propagada. 

O que em sua opinião não pode faltar em um pesquisador? Por que?

Curiosidade, dedicação e ética. A curiosidade porque é ela que move a ciência, é o saber que não se sabe que nos impulsiona a estudar, a descobrir e a inventar. A dedicação para realizar seu trabalho dentro do rigor que a ciência requer e para persistir diante dos desafios. A ética é essencial, já que sem ela não é possível construir uma base sólida nem para a ciência e nem para a sociedade em geral. 

Como vê os alunos do DCC/UFMG?

Ser professora no DCC é um privilégio. Recebemos alunos que estão entre os de melhor desempenho acadêmico do país. A UFMG é uma referência nacional na atração dos melhores alunos, e os cursos do DCC têm algumas das maiores notas de corte da instituição. Temos alunos embasados, dedicados e criativos. 

O que não pode faltar em um aluno do DCC/UFMG? Seja aquele que deseja ingressar na pesquisa ou no mercado de trabalho.

A busca pela excelência, por adquirir um embasamento teórico e prático sólido e que lhe permita sempre acompanhar a evolução da área. 

Como você define o DCC/UFMG?

Um dos maiores e melhores departamentos de Computação do país, que preza pelo desenvolvimento de ciência e tecnologia de ponta, pela excelência no ensino e extensão.

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