O professor do Departamento de Ciência da Computação, Marcos André Gonçalves, concedeu ao jornalista Simon Nascimento, do Jornal O Tempo, uma entrevista sobre o ChatGPT, uma plataforma que já foi utilizada, desde o seu lançamento, em novembro do ano passado, cerca de 100 mil usuários. A matéria foi publicada nesta segunda-feira, 13, e abaixo pode ser lida na íntegra.
ChatGPT: inteligência artificial impõe desafios, mas pode abrir mercados
Por Simon Nascimento
Ao navegar nas redes sociais nos últimos dias, você certamente deve ter se deparado com um termo – o ChatGPT – e se assustado com os comentários cerca da ferramenta. Alguns, mais preocupados, citam que a ferramenta de inteligência artificial vai dizimar profissões, reduzir a qualidade de ensino e aprendizagem e limitar o interesse pela pesquisa. Outros, mais amenos, apontam que é o início de um futuro inteiramente automatizado.
Mas fato é que o robô, que gera textos contextualizados – desde uma receita de bolo até códigos de programação – a partir das solicitações dos usuários, já foi utilizado por mais de 100 milhões de usuários desde o lançamento em novembro do ano passado e divide opiniões até mesmo entre quem estuda ou lucra com o mundo virtual. A Amazon, gigante do e-commerce, chegou a proibir o uso do GPT aos funcionários por temor de vazamento das informações da empresa.
Desde o lançamento, sentenças judiciais e trabalhos acadêmicos são alguns dos exemplos de uso do GPT mundo afora. Na Colômbia, um juiz chegou a dizer que a ferramenta funciona como um “secretário” . E na avaliação da coordenadora dos cursos de tecnologia do Ibmec BH, Sabrina Oliveira, essa é a verdadeira
função do chatbot. Para ela, os serviços de inteligência artificial, em um contexto mais amplo, devem ser adicionais nas rotinas de quem opta pela utilização.
“São ferramentas que vêm para facilitar o dia-dia em processos não condizentes com a inteligência de verdade. Os processos de tomada de decisão vão vir do ser humano, porque essas ferramentas vêm como auxílio para substituir atividades que não precisem de noção crítica e raciocínio”, crava a especialista. A
especialista explica que os textos gerados apresentam, dependendo da solicitação, um conjunto de boas informações. O que não, necessariamente, pode ser suficiente. “É puramente análise estatística, (o ChatGPT) vai falhar principalmente se você pede tópicos, situações específicas”, observa a professora. Para Sabrina, a limitação da inteligência artificial não altera o contexto educacional, já que há a possibilidade de receber textos finalizados da plataforma, mas sem preocupação com as fontes. Ela ainda lembra que o acervo do Google já fornece o mesmo nível de informações, mas sem organizá-las em texto.
“Chegaram a fazer testes com o GPT para criar redações com o tema do Enem e a pontuação foi muito boa, seguiu a gramática, norma cultura, mas quando é a argumentação, o tratamento do problema, a máquina não consegue ter esse poder de interpretação”, frisou. Professor do Departamento de Ciências da Computação da UFMG, Marcos André Gonçalves alerta que a plataforma exigirá mais rigor dos professores na análise de trabalhos entregues pelos alunos, a partir da possibilidade de uso da inteligência artificial. “A diferença é que agora (estudantes) vão ter um pouco menos de trabalho. Antes pesquisava no Google algumas fontes, alguns alunos copiavam, outros já elaboravam melhor um texto, escrevendo da maneira deles. Agora podem fazer a pergunta ao GPT e receber tudo pronto”, salienta. Gonçalves, apesar de notar inúmeros benefícios com a plataforma, teme que os estudantes tenham menos interesse no aprofundamento dos estudos. “Uma coisa que eu observo como professor de Ciências da Computação há quase 20 anos, é que cada vez mais os alunos estão, sem ser preconceituoso, com uma certa preguiça. Eles tendem a ir pelos caminhos mais fáceis, às vezes sequer leem o que escrevem. Neste sentido, pode sim aumentar uma tendência de esforço menor”, garante.
O docente, no entanto, acredita que a própria tecnologia pode solucionar as questões afetas à educação, com alguma atualização que indique a origem do material vindo da inteligência artificial. E se a inteligência artificial divide opiniões, por outro lado, há quem veja oportunidade de reinvenção tecnológica na educação. CEO da NextGen Learning, que trabalha com sistemas tecnológicos para educação, Luiz Alexandre Castanha acredita que ferramentas de inteligência virtual podem ser um auxílio dos professores na sala de aula. Ele também defende alguns requisitos de segurança para tornar o uso mais confiável, mas aponta que há uma oportunidade de “mudar a educação”. “Todos os mercados se atualizam, porque não a educação? Para o aluno, é uma visão de começar a ter um conhecimento não profundo, mas médio, de algum assunto que ele não tem total compreensão. Para os professores, é uma questão de desafio, de como poder usar essa ferramenta em favor dele, de propor trabalhos em cima disso”, argumenta Castanha.
Luiz Alexandre acredita que há caminho para alteração nos modelos de avaliação, incentivando os debates orais e não só apresentações por escrito. “Vai ter que surgir uma mudança de mentalidade no estilo de avaliação, no sentido de não querer somente uma entrega, mas pedir uma explicação, um debate, formas
mais elaboradas”, acrescentou. Em um momento de muitas dúvidas sobre os reflexos que o uso da inteligência artificial pode representar à sociedade, o mercado de programação digital pode se beneficiar com a expansão desse tipo de serviço. Após a criação do GPT, o Google abriu concorrência e anunciou o Bard, robô que também promete gerar textos a partir de informações em tempo real. Já a Microsoft, informou que vai incorporar a ferramenta da OpenAI aos
serviços de videoconferência, navegadores e ferramentas de busca.
Professor da UFMG, Marcos André Gonçalves lembra que o ChatGPT consegue criar códigos simples, que podem ser interpretados por profissionais que trabalham com a ciência da computação. “A inteligência artificial pode ser usada em vários contextos e aí você precisa de profissionais para trabalhar o conteúdo, os algoritmos, que podem ter outras aplicações em inteligência artificial e aí você vai precisar de programadores. Ou você pode ter a necessidade de outros programadores para tratar o conteúdo gerado pelo ChatGPT. O docente exemplificou que até mesmo serviços básicos, como o comércio, podem se beneficiar. “Pode-se usar o ChatGPT para personalizar determinado setor, um tipo de atendimento, e aí precisaria de um programador para personalizar um texto para um público-alvo”, complementa.
Sabrina Oliveira, do Ibmec BH, lembrou que os robôs de inteligência artificial já estão presentes na rotina da população, principalmente nos atendimentos automatizados que substituíram atendentes de telemarketing. “Eu vejo que as profissões que são ligadas à partes técnicas, se porventura sumirem, vão abrir mercado para desenvolvedores que vão otimizar, melhorar ou aprimorar esses tipos de softwares. E isso envolvendo todas as área, o nosso aluno circula por todas as áreas, dentro de hospitais, grandes siderúrgicas, escolas. Tudo precisa de gestão de dados”, apontou a coordenadora dos cursos de tecnologia do Ibmec.
Site: https://www.otempo.com.br/economia/chatgpt-inteligencia-artificial-impoe-desafios-mas-pode-abrir-mercados-1.2812071
A matéria teve repercussão e entrevista na Rádio Inconfidência, no podcast da Rádio Inconfidência, na TV Assembleia e na Record TV Minas.