Excelência no ensino e pesquisa, além de grande carisma entre os alunos, definem o professor do DCC Clodoveu Davis

A vida pode levar a caminhos nunca imaginados, com realidades distintas às planejadas e, mesmo que a princípio possam parecer estranhas, pode surpreender de forma positiva, trazer alegrias, transformar e mostrar dons que estavam escondidos. Em uma estrada, sem aparente bifurcação, pode-se entrar acreditando saber onde será o final, mas quando percebe, a estrada leva a um caminho totalmente distinto. Isto aconteceu com o professor do Departamento de Ciência da Computação da Universidade Federal de Minas Gerais (DCC/UFMG), Clodoveu Augusto Davis Junior.

Por gostar de coisas diferentes, Clodoveu fez o vestibular na UFMG, em 1979, para Engenharia Civil. Nesta época, o curso de Ciência da Computação tinha apenas dois anos de existência. Durante a graduação, enveredou para a produção de software para engenharia. Após atuar com isso por alguns anos em uma empresa de consultoria e projetos, partiu para o mestrado, onde buscou ampliar seu conhecimento na Computação. Depois de quatro anos, mudou-se para a Prodabel, empresa de informática do município de Belo Horizonte. Quatro anos depois, a empresa solicitou que fizesse o doutorado, já que desejavam montar um programa de pesquisa e desenvolvimento. Assim, buscou essa qualificação também no DCC/UFMG, se formando no ano 2000. Nem no mestrado nem no doutorado, o objetivo foi ser docente. Mas, mesmo antes de finalizar o doutorado, em 1997, começou a carreira como professor convidado na UFMG, onde lecionava no Curso de Especialização em Geoprocessamento, no Instituto de Geociências.

Talvez linhas tortas tenham levado Clodoveu à docência e o tirado da instituição em que trabalhava – o professor já tinha 17 anos de experiência de mercado. Mas, o fato é que se tornou um pesquisador premiado e respeitado, além de muito querido, homenageado e paraninfo de diversas turmas formandas. Casado há 34 anos com a Elizabeth, ex-colega da turma de Engenharia, tem dois filhos, Alexandre e Paula, que também foram para as áreas de trabalho do pai: ele em Computação (mestrado pelo PPGCC) e ela em Administração Pública (mestrado no CEPEAD/UFMG).

Nas horas vagas, o professor gosta de fazer trabalhos manuais e construir coisas. “Os amigos e colegas mais próximos conhecem meus diversos hobbies e atividades, todas do tipo “mão na massa”, para compensar as horas abstratas em Computação. Trabalho com bonsai e outras plantas, monto miniaturas, faço algumas coisas em marcenaria. De uns dez anos pra cá, comecei a obter, reparar e restaurar calculadoras antigas, algumas eletromecânicas, a maioria apenas mecânicas, das décadas de 1920 a 1960. Já tenho umas 15. Ao longo da pandemia, construí uma impressora 3D com estrutura em madeira, onde pretendo imprimir teclas e outras peças para as calculadoras”, contou.

Além de professor e pesquisador, atualmente o Clodoveu é o sub-coordenador do Museu do DCC, que está sendo estruturado com peças antigas, infraestrutura e toda a história da Computação no Brasil e no mundo. Quando se aposentar, pretende doar o acervo pessoal ao Museu. “O início do Museu do DCC foi o Núcleo de Memória Professor Newton Lages, que funcionava no 4º andar do Instituto de Ciências Exatas (ICEx). Ao acervo, que é principalmente de projetos de hardware construídos em pesquisas do DCC nos seus primeiros anos, somou-se uma coleção de equipamentos ligados a imagens, do professor Arnaldo Albuquerque Araujo, atualmente coordenador do museu. Também somamos ao acervo computadores mais antigos, que o DCC tinha preservado, e muitos outros itens. O Museu foi recebendo doações de outros tipos (como mídia digital e videogames), e o professor Arnaldo ainda garimpou alguns objetos em depósitos de outras unidades da UFMG.” falou empolgado.

De acordo com o professor, com as instalações novas haverá como mostrar a história da Computação e do DCC para os alunos, além de atrair visitas de estudantes do ensino médio e básico e, assim, novos discentes para a área e para os cursos do Departamento. “Recentemente contratamos um projeto de arquitetura para reformatar o corredor do 2º andar do ICEx. Nesse espaço, foram projetadas uma sala de convivência e estudos para alunos da pós-graduação, uma sala de seminários à la 2077 (com sala de reunião anexa, para bancas) e o espaço para o Museu”, descreveu.

Professor dos cursos de graduação e no Programa de Pós-graduação em Ciência da Computação, Clodoveu tem experiência na área de Ciência da Computação, com ênfase em geoinformática, e atua principalmente com os temas: bancos de dados geográficos, sistemas de informação geográficos (SIG), infraestruturas de dados espaciais, geoprocessamento, modelagem de dados geográficos, geocodificação e aplicações urbanas de SIG. Para a professora Mirella Moura Moro, Clodoveu foi uma grande aquisição para o DCC, com uma longa experiência na PRODABEL e na PUC-MG. “Ele é um professor exemplar, com uma didática ímpar e muito apreciada pelas suas turmas. Mais do que isso, é uma pessoa correta, prestativa e um excelente amigo”, afirmou.

Nessa entrevista à comunicação do DCC, o professor conta mais sobre a vida estudantil, o que o inspira, os desafios, as pesquisas, os alunos e muito mais, veja a seguir e o conheça melhor:

Qual foi o maior desafio, incentivo e inspiração enquanto estudante, desde a graduação? (ou quais) Aprender é muito bom, não é? Nada é mais inspirador que aprender coisas novas e acumular ferramentas com as quais poder ajudar a melhorar o mundo. Em paralelo à trajetória na engenharia, vinham os desafios de programação; junto aos de programação, a evolução do hardware e a disseminação da computação pessoal. Nas empresas, um desafio enorme com as sucessivas crises econômicas dos anos 1980, que ora paralisaram as obras, ora as reativaram. Fui estudante de graduação em um período complicado, nos estertores do regime militar, na beira da redemocratização e com a grande crise de inflação começando. Como formar uma família, evoluir pessoalmente e em uma carreira nesse tipo de ambiente? Esse era, de fato, o maior desafio.

O que mais te marcou durante o período de estudante? Um certo senso de obsolescência de várias das técnicas de engenharia que eu estava aprendendo (cálculo estrutural, hidráulica, hidrologia, mecânica de solos, saneamento básico, grandes obras de infraestrutura, construção predial) em face da evolução da Computação. Eu vi desde cedo aí um nicho de oportunidade, que se realizou. Fui “engenheiro analista de sistemas” por sete anos, ganhando bem mais que meus colegas de turma, engenheiros “regulares”.

O que o motivou a ser professor? Nunca esteve em meus planos ter carreira docente. Entre graduação e mestrado, foram quatro anos — e não fui ao mestrado para ser professor, fui para melhorar minhas atividades em engenharia. Depois do mestrado, demorei outros quatro anos para entrar no doutorado — e só o fiz a pedido da empresa onde trabalhava, que queria aumentar sua qualificação e montar um programa de pesquisa e desenvolvimento. Só depois, quando a má política encerrou essa iniciativa é que fui buscar a vida acadêmica. Eu já tinha 17 anos de carreira.

O que te inspira como professor? Quem melhor define a inspiração de um professor, na minha opinião, é Richard Feynman (físico): se você quiser realmente entender um assunto, o ensine. Então posso dizer que ensino e procuro ser bom no ensino, para conseguir dominar melhor os assuntos lecionados.

Como se define como professor? Relutante, inquieto, provocador. Procuro sempre evoluir, melhorar, aperfeiçoar, arranjar maneiras melhores de ensinar. Costumo dizer que o pior para o professor é que, a cada final de semestre, os alunos evoluem para novos desafios e o professor reinicia o ciclo mais uma vez. Procuro não ficar prisioneiro desse ciclo.

O que ensina no DCC/UFMG e como faz? Em quase 14 anos de DCC, já fui responsável por umas 12 disciplinas distintas. As principais são as da área de bancos de dados. Apenas recentemente comecei a lecionar uma disciplina introdutória a bancos de dados mas, desde 2008, leciono uma vez ao ano uma disciplina da minha área de principal interesse: bancos de dados geográficos. Se “onde” é importante para os seus dados, as técnicas dessa área são imprescindíveis e valiosas. Como tudo, ou quase tudo, tem conexões com o espaço geográfico, a aplicabilidade dessa área é enorme.

Por que decidiu ir para a área de pesquisa e não para o mercado de trabalho? Antes de vir para a UFMG, tive 20 anos de experiência em empresas públicas e privadas. Desde 2002, tive seis anos em uma instituição de ensino privada, e agora somo 14 anos na UFMG. Também posso dizer que atuei em pesquisa, ainda vinculado à empresa, e cheguei a receber bolsa de produtividade em pesquisa do CNPq, mesmo não estando vinculado a uma universidade ou centro de pesquisa.

O que o inspira em suas pesquisas e qual o maior objetivo delas? Transformar ideias em ação. Demonstrar que funcionam e expor seu potencial.

No geral, qual o impacto das suas pesquisas no dia a dia das pessoas? Vários projetos de pesquisa dos quais participei, ou coordenei, tiveram impacto direto e geraram ferramentas ou aplicações em retorno para uso da sociedade. Recentemente, várias delas têm retorno para o ambiente acadêmico, particularmente às relativas aos dados geográficos. Mas um produto muito importante das pesquisas são os pesquisadores formados: os mestres e doutores, e os graduandos com experiência de iniciação científica.

Qual o maior desafio (ou quais os maiores desafios) que encontra para realizar as pesquisas? Tenho tido sucesso no financiamento das pesquisas, tanto com recursos públicos de fomento quanto de outras fontes. Também posso afirmar que a grande maioria dos alunos que trabalharam comigo nesses projetos de pesquisa tiveram excelente desempenho e dedicação. Um desafio, cada vez mais presente, diz respeito aos dados públicos: cada vez mais observo que dados outrora tornados públicos por instituições governamentais, em ações de transparência, vão se tornando fechados ou pobres. Enquanto isso, as grandes empresas privadas do mundo digital vão fechando os dados, encapsulando-os em sistemas fechados e que prestam, ironicamente, serviços gratuitos à população. Como existem os serviços gratuitos, os governos (e as sociedades) vão abandonando seus processos de trabalho para geração de dados públicos e se tornando reféns dessas empresas.

O que em sua opinião, o que não pode faltar em um pesquisador? Por que? Curiosidade, evidentemente. No Brasil, resiliência é uma certa dose de idealismo saudável. Afinal, somos movidos pela curiosidade e por ela enfrentamos diversos tipos de obstáculos e dificuldades estruturais, condições sempre variáveis, daí resiliência. Isso tem limite, daí falar em idealismo saudável: só se consegue viver de idealismo até certo ponto. Por fim, o pesquisador precisa ser um cidadão e entender como cidadão do que a sociedade mais precisa. Lógico que há áreas do conhecimento que não podem se guiar por isso, mas em Computação essa conexão com o mundo e a sociedade reais é necessária.

Como vê os alunos do DCC? Todo aluno que chega à universidade, em especial uma instituição do nível da UFMG, sobreviveu a vários desafios. Então todo aluno, mesmo os calouros, são veteranos em algum sentido. Precisam sobreviver ao choque da mudança do ensino médio para o ambiente diverso da universidade, cheio de oportunidades e distrações. Os alunos do DCC, em particular, são intensamente desafiados a ir além dessa sobrevivência e avançar com competência e dedicação. Quem consegue tem futuro garantido e uma vida profissional sem rotina — e eles sabem disso. 

O que não pode faltar em um aluno do DCC? Foco e dedicação. Tanto a academia quanto o mercado de trabalho demandam um comportamento ético e profissional que vai além do que ensinamos diretamente. Portanto, nós, professores e servidores técnico-administrativos em educação, precisamos servir de exemplo. Se o aluno adquirir a competência profissional no curso e se pautar pelos bons exemplos que existem em abundância na comunidade do DCC, terá um bom começo. Seja aquele que deseja ingressar na pesquisa ou no mercado de trabalho.

O que representou e representa o DCC em sua vida estudantil e agora profissional e, até mesmo, no campo pessoal? Fui aluno da UFMG, via Escola de Engenharia, por cinco anos. Fui vinculado como estudante ao PPGCC por oito anos e meio. Como professor, em julho, completo mais 14 anos. Nos intervalos, meus diplomas e títulos me serviram como um importante cartão de visitas. É uma satisfação ter me tornado professor na instituição onde estudei e poder trazer de volta o que vivi fora dela.


Como você define o DCC? O DCC é uma plataforma de lançamento. Ou uma catapulta. Quem aqui está se junta à comunidade e faz a sua parte, com toda probabilidade irá longe.

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