Pesquisadores do DCC e do Inter usam inteligência artificial para detectar indícios de lavagem de dinheiro em transações bancárias

No último sábado, 29 de outubro, foi comemorado o Dia Nacional da Prevenção da Lavagem de Dinheiro. A data é uma iniciativa de várias instituições que compõem a Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro, a ENCCLA, e o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime, o UNODC. O termo “lavagem de dinheiro” se refere a práticas econômico-financeiras que têm por objetivo esconder a real origem ilícita de ativos financeiros ou bens patrimoniais. Em outras palavras, lavar dinheiro significa justificar a existência de riquezas obtidas de forma criminosa por meio da execução de falsas operações idôneas, assim acobertando crimes como a extorsão, a corrupção e o terrorismo, bem como o tráfico de pessoas, armas e drogas.

Em 2019, o Relatório Global de Fraude & Risco da Kroll [link] apontou o Brasil como líder mundial em lavagem de dinheiro: a prática foi testemunhada por 23% dos entrevistados,  enquanto a média global era de 16%. Divulgado no início de outubro de 2022, relatório da Transparência Internacional [link] denuncia recuo do país no combate à corrupção e à lavagem de dinheiro: o Brasil regrediu de implementação “moderada”, na avaliação divulgada em 2020, para implementação “limitada” de mecanismos contra o suborno transnacional. Para ajudar a reverter essa situação, o Inter mantém procedimentos de monitoramento, seleção, análise e comunicação de situações suspeitas de lavagem de dinheiro, financiamento ao terrorismo e uso de armas de destruição em massa. Em um cenário de rápida expansão da carteira de clientes e da oferta de serviços bancários digitais, a efetividade desses procedimentos é de fundamental importância. Foi por esse motivo que o Inter, por meio de seu laboratório de pesquisa aplicada em inteligência artificial, o Inter Mind, celebrou uma parceria com o Departamento de Ciência da Computação (DCC) da UFMG, que contou com a participação do aluno de bacharelado em Sistemas de Informação, Henrique Soares Assumpção e Silva, e dos alunos de pós-graduação, Fabrício Souza, Leandro Lacerda Campos e Vinícius Pires. Os dois últimos também são colaboradores do Inter.

De acordo com a legislação brasileira, instituições do sistema financeiro devem comunicar à unidade de inteligência financeira – COAF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) quaisquer casos que possam configurar lavagem de dinheiro. O Inter, por exemplo, utiliza um sistema baseado em regras para identificar situações suspeitas. “Quando um cliente do Inter movimenta uma quantia que é considerada incompatível com a sua condição financeira, esse cliente é enquadrado em alguma das regras do sistema de monitoramento e encaminhado para análise pela nossa equipe de Prevenção à Lavagem de Dinheiro, Combate ao Financiamento do Terrorismo e ao Uso de  Armas de Destruição em Massa (PLD/FTP). Se a análise não afasta a hipótese de incompatibilidade da movimentação, o caso é então comunicado à nossa unidade de inteligência  financeira”, exemplifica Fabio S. Ieiri, gerente executivo do Inter e responsável pela área de PLD/FTP. Nesse contexto, o principal objetivo da pesquisa conduzida pelo DCC e pelo Inter Mind foi propor um modelo de aprendizado de máquina para complementar o sistema atualmente em uso, identificando casos suspeitos que não se enquadram em nenhuma das regras até então implementadas.

O modelo proposto pela parceria recebeu o nome de Delator. Ao invés de se basear em regras, esse modelo opera com base na similaridade entre situações de clientes. “Se a situação de um cliente do Inter em um determinado período é de alguma forma similar à de outros clientes que já foram comunicados à unidade de inteligência financeira, o Delator tende a classificá-la como suspeita”, afirma o professor e pesquisador do DCC, Fabrício Murai. Para inferir essa situação, o Delator considera tanto as características e comportamentos do cliente quanto a situação das pessoas com as quais ele transacionou no período. Para dotar o Delator dessa habilidade, os pesquisadores empregaram uma arquitetura de redes neurais em grafos. “No caso do Delator, cada pessoa é um vértice do grafo e cada transação é uma aresta conectando dois vértices. Para aprender esse grafo, o Delator precisa executar duas tarefas: prever a existência de uma transação entre duas pessoas e estimar o valor dessa transação, caso ela exista”, detalha Murai. “A situação de um cliente é representada por algum dos vértices desse grafo. Uma vez que o Delator aprende a inferir essa situação, ele é treinado para executar a terceira e última tarefa: classificar se a situação é ou não suspeita de lavagem de dinheiro dada à similaridade entre essa situação e outras que já foram analisadas pela equipe de PLD/FTP”, complementa o pesquisador.

Mais informações sobre o Delator, inclusive sobre resultados de validação e de comparação com outras abordagens, são apresentadas no artigo “Delator: Detecção Automática de Indícios de Lavagem de Dinheiro por Redes Neurais em Grafos de Transações” [link]. Este artigo foi apresentado e premiado como melhor artigo no BraSNAM – XI Brazilian Workshop on Social Network Analysis and Mining, realizado durante o 42º Congresso da Sociedade Brasileira de Computação. Paulo Laurentys, superintendente de Dados & Analytics do Inter e responsável pelo Inter Mind, destaca um dos experimentos descritos no artigo. “Em um determinado mês, considerando apenas os clientes que não foram enquadrados em nenhuma das regras do nosso sistema de monitoramento, selecionamos um conjunto de clientes com as situações mais suspeitas segundo o Delator. Após análise, concluímos que 14% dos casos selecionados deveriam ser comunicados à unidade de inteligência financeira. Esse resultado mostra o valor do Delator como um complemento ao nosso sistema. Também demonstra o seu valor como uma fonte de insights, sugerindo novas regras que poderiam ser adicionadas ao nosso sistema e regras existentes que poderiam ser aperfeiçoadas. Estamos trabalhando para colocar o Delator em produção nos próximos meses”, conclui.

Essa matéria teve repercussão na mídia, sendo: Estado de Minas, Diário do Comércio On-line, Portal UFMG, Band News e BHAZ

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