“Algoritmos refletem as desigualdades da sociedade“, diz Virgílio Almeida em aula magna

Professor do DCC falou sobre os desafios éticos da inteligência artificial na abertura do segundo período letivo; conferência também será ministrada aos calouros dos cursos noturnos

Estamos vivendo em um mundo impactado pela pandemia, por conflitos e guerras, pelas mudanças climáticas e pela imensa desigualdade econômica e social, especialmente no Brasil. E com o surgimento das novas tecnologias digitais e a interação cada vez mais rotineira com plataformas comandadas pela inteligência artificial (IA), uma importante questão se apresenta: que mundo queremos com essa transição imposta pelos algoritmos?

A provocação foi posta aos novos estudantes da graduação da UFMG pelo professor Virgílio Almeida, emérito do Departamento de Ciência da Computação (DCC), na manhã desta segunda-feira, dia 14, durante aula magna no Centro de Atividades Didáticas  I (CAD I), no campus Pampulha. A aula ocorreu no auditório nobre e foi transmitida para outros três auditórios – todos ficaram lotados. Com o tema Inteligência artificial: oportunidades e desafios, a conferência, que será realizada também às 19h, no mesmo local, abriu as atividades da Semana de Acolhimento, que se estenderá até 24 de agosto.   

O professor Virgílio, egresso do curso de Engenharia Elétrica da Universidade, na década de 70, é uma das maiores referências em tecnologias digitais, com atuação transdisciplinar que perpassa os campos econômico e social. “Escolhi falar desse tema para vocês, que acabam de ingressar na UFMG, pois esse é o lugar para a produção de novas ideias e conhecimentos, de forma conjunta no ensino, na pesquisa e na extensão”, afirmou.

Professor emérito do Departamento de Ciência da Computação
Virgílio Almeida: ampliar o debate é necessárioFoto: Foca Lisboa | UFMG

Para Virgílio Almeida, “grande parte das questões fundamentais da atualidade precisam ser tratadas de maneira multidisciplinar”, o que torna a UFMG, segundo ele, um lugar propício para a nova geração de estudantes, “que deverão fazer diferença na sociedade”.

O uso das plataformas digitais, comandadas por inteligência artificial, do Facebook ao ChatGPT, é cada vez mais frequente entre as pessoas do mundo inteiro, e seus impactos exigem amplo debate, na avaliação do professor. Ele citou exemplos de questões levantadas em diferentes países, como a apresentada pela assessoria cientifica do Vaticano, que resume uma das suas grandes preocupações: “Quais são os direitos que queremos sacrificar em nome da eficiência prometida pelas tecnologias digitais?”.   

Decisões
Na avaliação de Virgílio Almeida, esse é um questionamento relevante, pois traz à reflexão os impactos da IA na ética, na justiça e na democracia. Segundo ele, três pontos são fundamentais nessa discussão: as decisões das plataformas operadas por algoritmos (em linhas gerais, algoritmos são, em computação, o conjunto de instruções que executam determinado objetivo), o tratamento individualizado conforme as observações do usuário e a coleta de dados. “Essa observação e a coleta de dados de todas as nossas interações não humanas – desde o uso do cartão de crédito até a postagem sobre um tema político de nossa preferência – contribuem para as decisões dos sistemas inteligentes. Mas será que essas decisões são éticas e justas?”, provocou.

O professor emérito lembrou que muitos serviços digitais utilizados em vários países, como reconhecimento facial, reconhecimento por voz ou até mesmo a chamada de uma fila de transplante de órgãos, valem-se de milhares de dados dos usuários. Mas o grande desafio é que esses dados também refletem as desigualdades e o racismo históricos das sociedades. “Por isso, a necessidade da multidisciplinaridade na discussão de regras para regulamentar essa interação com não humanos, uma realidade com a qual os novos estudantes da UFMG devem lidar como oportunidade”, encorajou.

Sandra Goulart: experiência de abrigar a vida nova se repete a cada semestre
Sandra Goulart: experiência de abrigar a vida nova se repete a cada semestreFoto: Foca Lisboa | UFMG

A UFMG nesse cenário
“E a UFMG não está parada diante desse tema”, garantiu Virgílio, ao destacar a participação da instituição – por meio do DCC/ICEx, da Escola de Engenharia, da Faculdade de Medicina e outras unidades das ciências da saúde –, juntamente com mais oito universidades, no Centro de Inteligência Artificial na Saúde (CIIA), que estuda a viabilidade do diagnóstico da doença de Chagas por meio de dados coletados por sistema de telessaúde. “O DCC está sempre em busca de apoiar práticas de IA para aumentar a segurança, a confiança e a credibilidade. Mas precisamos discutir a governança desse uso também no ensino, por professores e alunos”, concluiu.

Na mensagem de boas-vindas aos estudantes, a reitora Sandra Regina Goulart Almeida, após apresentar a equipe da Reitoria, destacou a proposta da instituição, fundamentada em seu lema de fundação, Incipt vita nova, para que os novos integrantes usufruam da “nova vida que se inicia”. “Todo semestre temos essa linda experiência de abrigar a vida nova, trazida por vocês, à nossa universidade. Vocês iniciam uma travessia que deve ter o sentido do tema Viver a UFMG, com todas as suas atividades de ensino, pesquisa, extensão e cultura. Vivam a UFMG como uma experiência ímpar, nesse lugar peculiar, de respeito à diversidade e à liberdade de expressão e de formação cidadã”, convidou a reitora.

Sandra Goulart ressaltou a posição da UFMG emrankings internacionais para reafirmar a necessidade de mobilização conjunta em defesa da universidade pública, responsável por 95% da pesquisa nacional, com a hashtag #eudefendo.

“Divulguem o belo trabalho que temos feito, como a primeira vacina nacional contra a covid-19, a SpiN-TEC, e a outra contra a dependência de cocaína, a Calixcoca [ambas são finalistas do Prêmio Euro Inovação na Saúde], tão importante para a construção de um país melhor. Aqui, vocês terão a garantia de uma educação de qualidade e formação cidadã e ética. Então, como dizia o professor José Murilo de Carvalho, falecido ontem [13 de agosto], e a quem aproveito para homenagear: ‘Da UFMG não saí e nunca quero sair’. Que assim seja também com vocês – sejam UFMG, sempre UFMG. Bem-vindos”, disse a reitora.

Priscila Martins Vieira e Vater Júnior da Silva : duo de trompete e clarineta da Escola de Música
Priscila Martins Vieira e Valter Júnior da Silva, da Escola de Música: trompa e clarineta Foto: Foca Lisboa | UFMG

A programação foi encerrada com apresentação do duo de trompa e clarineta formado por Priscila Martins Vieira e Valter Júnior da Silva, da Escola de Música da UFMG.

Teresa Sanches – UFMG

Fotos: Foca Lisboa – UFMG

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