Pedro, Fabrício e Julio associaram características dos textos das manchetes a sentimentos |
Notícias ruins atraem mais leitores do que as positivas ou neutras, constatou pesquisa do Departamento de Ciência da Computação da UFMG que será apresentada em conferência na Universidade de Oxford (Reino Unido) no fim deste mês. A partir da análise do conteúdo de 69.907 manchetes produzidas por quatro veículos online – The New York Times, BBC, Reuters e Daily Mail – durante período mínimo de oito meses consecutivos em 2014, os pesquisadores observaram que cerca de 70% das notícias diárias estão relacionadas a fatos que geram sentimentos negativos, como catástrofes, doenças, crimes e crises.
“Descobrimos que a popularidade da notícia está fortemente ligada ao sentimento gerado por ela”, afirma o professor Fabrício Benevenuto, orientador de dissertação de mestrado defendida em março por Julio Reis, co-orientada pela professora Raquel Prates. Com o intuito de descobrir as estratégias usadas pelos veículos para atrair cliques dos leitores, os estudiosos extraíram características dos textos das manchetes, relacionando-as a sentimentos por elas gerados, numa escala de -5 (muito negativo) a +5 (muito positivo).
A organização dos dados resultou em gráfico em que os dois extremos, que mostram maior popularidade, são mais altos, pois quanto mais positiva ou negativa, mais cliques recebe uma manchete. “Ainda que o extremo positivo também desperte muito interesse, as notícias de maior apelo são as de caráter negativo”, resume Benevenuto. Também foram analisados os comentários postados para cada matéria específica.
“Pensamos que uma notícia positiva levaria as pessoas a fazerem comentários do mesmo teor, mas isso não acontece. Há uma tendência de o comentário ser negativo independentemente do sentimento gerado pela manchete”, comenta o professor Pedro Vaz de Melo, que integra o grupo de pesquisa, lembrando que muitos sites estão fechando a seção de comentários, pela constatação de que geram discussões inúteis. “Durante o período da coleta de dados, a agência Reuters desativou os comentários”, acrescenta Julio Reis. Segundo ele, houve uma tendência na Web “de abrir comentário para tudo, mas percebeu-se que isso pode ser ruim para os sites”.
Extração de dados
Para acessar o número de cliques recebidos pelas notícias, os pesquisadores criaram o programa Magnet News (site) que recolhe e classifica as manchetes replicadas pelo Twitter com auxílio do encurtador de URL Bit.ly. “Esse encurtador nos permite obter mais informações sobre cada URL – Uniform Resource Locator, endereço virtual na rede mundial de computadores – como o número de vezes que ela foi clicada”, explica o Benevenuto. De livre acesso, o programa Magnet News continua recolhendo manchetes dos mesmos veículos, já que o trabalho do grupo é mais amplo e focaliza outros aspectos da chamada análise de sentimentos, área que oferece vasto campo de pesquisa, como opinião sobre produtos e serviços. Outro sistema criado pelo grupo para dar suporte ao projeto está no endereço www.ifeel.dcc.ufmg.br.
Para inferir a popularidade de uma notícia, o pesquisador Julio Reis utilizou método de análise de sentimentos baseado em aprendizagem de máquina, técnica na qual são oferecidos dados rotulados a um algoritmo, com a intenção de que ele extraia automaticamente os mesmos padrões de outros textos. A técnica usada por Julio Reis correlaciona a popularidade com a polaridade (negativa ou positiva) de cada notícia. “Duas semanas após coletar as notícias, ele [o algoritmo] ia ao Bit.ly e baixava o número de cliques, para ter sempre o mesmo período em relação à data em que a manchete foi publicada”, explica Benevenuto.
As notícias foram divididas em cinco grandes categorias – Negócios e dinheiro; Saúde; C&T; Esportes; Mundo. A última revelou-se a mais homogênea, com praticamente todas as notícias negativas. “Nela só se publicam informações sobre catástrofes ao redor do mundo. Lemos um artigo que sugere que isso ocorre para dar às pessoas a sensação de que o país que está produzindo a notícia é um lugar melhor e mais seguro do que os outros”, comenta Julio Reis.
Reportagem: Ana Rita Araújo - Boletim UFMG Foto: Luiza Ananda