Equipamento, que começou a ser desenvolvido no Departamento de Física, tem potencial para contribuir com avanços disruptivos no campo da nanotecnologia
Historicamente dependente de tecnologia estrangeira, o Brasil acaba de fazer o caminho inverso: exportar um instrumento científico de ponta e de alto valor agregado. O feito foi protagonizado pela FabNS (Fábrica de Nanossoluções), que enviou para a Alemanha um equipamento de espectroscopia óptica de campo próximo, um nanoscópio.
O nanoscópio Porto foi desenvolvido pela empresa FabNS, sediada no Parque Tecnológico de Belo Horizonte (BH-TEC) e criada por egressos da UFMG. O equipamento foi enviado ontem, 8, para a Alemanha, centro de referência em instrumentação científica.
A tecnologia desenvolvida pelos pesquisadores da FabNS é capaz de revelar imagens na escala de um nanômetro (medida 1 bilhão de vezes menor que o metro) e, com isso, pode auxiliar nos estudos de composições de elementos como o grafeno, material extremamente flexível, supercondutor, aplicado, por exemplo, na indústria automobilística, na produção de eletrônicos e em processos de dessalinização da água.
Um dos fundadores da FabNS, Cassiano Rabelo explica que o equipamento conta com um diferencial único de qualidade em todo o mundo: uma nanoantena capaz de gerar resultados sem precedentes. Ele acrescenta que a contribuição da UFMG foi essencial para o desenvolvimento das pesquisas que culminaram na fabricação do Porto, visto que o desenvolvimento do equipamento teve início no Laboratório de Nanoespectroscopia (LabNS) do Departamento de Física do Instituto de Ciências Exatas (Icex) da UFMG.
“Todo esse potencial tecnológico traz desafios importantes. A UFMG foi essencial em todo o processo, nos dando muito abertura e fornecendo a infraestrutura dos laboratórios onde desenvolvemos as pesquisas. O ecossistema local foi fundamental para a viabilidade da produção do Porto”, diz Rabelo.
O engenheiro e também sócio da FabNS, Taiguara Tupinambás, acrescenta que a exportação do Porto mostra o potencial do país para produzir e exportar tecnologia. “Nossa experiência pode auxiliar no desenvolvimento de avanços disruptivos em nanotecnologia. A exportação dessa tecnologia rompe com o histórico de importações de alto valor de instrumentos científicos, e o Brasil passa agora a exportar.”
Para o professor do Departamento de Ciência da Computação e um dos pesquisadores responsáveis pelo projeto, Omar Paranaíba, o feito da FabNS é muito emblemático. “Nosso país, infelizmente, tem sido caracterizado por exportar commodities sem valor agregado e importar tecnologia. A indústria brasileira, com raras exceções, não tem tradição no desenvolvimento de produtos desenvolvidos a partir criação de ciência básica. Somos meramente reprodutores de bens já desenvolvidos. A FabNS inverte essa lógica. O produto da empresa nasce a partir do desenvolvimento científico sólido desenvolvido na UFMG. O fato de hoje exportar essa alta tecnologia para a Alemanha é muito simbólico, uma vez que esse país é reconhecimento pelo avançado desenvolvimento tecnológico. Durante o processo de desenvolvimento do nanoscópio PORTO, a unidade Embrapii/DCC teve papel importante, permitindo o desenvolvimento dos primeiros protótipos pré-comercial, base para o equipamento agora exportado”, contou.
Interesse estrangeiro
A exportação do equipamento é o ponto alto de um ciclo iniciado em 2005, quando foram obtidos os primeiros resultados das pesquisas que geraram o nanoscópio. Após anos de trabalhos no LabNS, a FabNS foi criada em 2020, estabelecendo sua sede no BH-TEC em 2022.
O interesse da instituição alemã pelo aparelho surgiu durante um congresso internacional, quando um grupo de pesquisadores do laboratório de física de novos materiais da Universidade de Humboldt soube da tecnologia que estava sendo desenvolvida no Brasil. A negociação foi feita com o líder do grupo, Sebastian Heeg, professor daquela instituição de ensino.
“Essa operação criou um diferencial tecnológico muito importante, ainda mais pelo fato de estar sendo exportado para a Alemanha, que é uma referência mundial em instrumentação científica nessa área de caracterização de materiais”, reforça o CEO da FabNS, Hudson Miranda.
Coleção de feitos
A exportação do nanoscópio é mais um feito para o rol da FabNS. Em 2021, o grupo de egressos da UFMG que fundou a empresa emplacou a capa da Nature, com a publicação de artigo que mostrava a eficiência do nanoscópio produzido com nanoantenas óticas patenteadas pelos pesquisadores.
A caixa que deixou o aeroporto de Confins rumo à Alemanha levou o gabinete do nanoscópio, componentes eletrônicos – 13 placas eletrônicas com mais de 2 mil componentes projetados e desenvolvidos pela FabNS – , o sistema de varredura de sonda e as caixas com as nanoantenas.
Além de consolidar o país como exportador, a FabNS agora almeja fomentar o mercado nacional. “Enxergamos um bom horizonte, com movimentos governamentais para permitir que empresas tenham produtos intensivos em capital intelectual para criar esse diferencial. É importante criarmos essa base aqui para desenvolver ciência de ponta”, acrescenta Hudson Miranda.
A FabNS tem quatro sócios-fundadores, todos egressos da UFMG: o pesquisador Cassiano Rabelo, o engenheiro Hudson Miranda, o físico e servidor do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) Thiago Vasconcelos e o engenheiro Taiguara Tupinambás. Os professores Ado Jorio de Vasconcelos e Luiz Gustavo Cançado, ambos do Departamento de Física do ICEx, atuam como conselheiros no grupo.
Matéria republicada do site da UFMG com acréscimo da fala do professor do DCC, Omar Paranaíba e foto da equipe.
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